Para quem estranha a omissão do presidente do Senado, David Alcolumbre, e da Câmara, Hugo Motta, quanto a uma conduta correta e enérgica que se esperava ver em relação à taxação de 50% que o presidente Donald Trump fez ao Brasil, e à sua intromissão em questões da justiça brasileira, aqui vai uma óbvia explicação: o Supremo Tribunal Federal tem sob seu julgamento, neste momento, nada menos do que 80 inquéritos que analisam graves irregularidades cometidas no Congresso na distribuição obscura das emendas parlamentares.
As informações sobre esse agigantado número de inquéritos são dadas pelo próprio ministro Flávio Dino, a quem o STF atribuiu a missão de conduzir o julgamento desses desvios das emendas. São notícias que correm durante as conversas que ele tem tido com deputados e senadores na tentativa de sanar as irregularidades e impor ao Congresso uma forma de exercício lícito com essas emendas parlamentares, de maneira clara, transparente, sem a configuração de ações criminosas como até hoje vêm sendo constatadas.
Os críticos de Motta e Alcolumbre enxergam que os dois dirigentes parlamentares- ao divulgarem uma nota vazia de posicionamento, apenas aludindo que o Congresso Nacional “está preparado para atuar com moderação e determinação na proteção da economia brasileira- “, ficaram literalmente em cima do muro, não assumindo qualquer enfrentamento aos atos descabidos de Trump, que agrediu o Supremo Tribunal Federal, tentando interferir nas decisões da justiça local quanto aos crimes cometidos pelo ex-presidente da República e seguidores na tentativa de golpe de Estado, e buscou acuar o governo brasileiro de modo visível, escolhendo-o como inimigo.
Na tentativa de amenizar o impasse trazido por Donald Trump ao Brasil, os dirigentes de Câmara e Senado dão mostras de que estão passando o pano, como se as agressões feitas pelo mandatário norte-americano não dissessem respeito a todo o país e suas instituições. E aqui, novamente, os críticos a Motta e Alcolumbre indicam que, nesse contexto, como o STF vem segurando, desde o ano passado, R$ 4,2 bilhões da execução das emendas, proibindo o governo de pagá-las, os dirigentes das duas Casas aproveitam o deplorável momento imposto por Trump, para mandar um recado ao Supremo.
Assim como Trump, inspirado no bolsonarismo, está tentando impor ao STF que libere o ex-presidente dos inquéritos a que responde e aí os EUA retiram as tarifas de 50% sobre o Brasil ( e é isso que os filhos do ex-presidente têm dito repetidamente), Motta e Alcolumbre parecem sugerir que a Suprema Corte brasileira libere os valores retidos das emendas parlamentares, que aí tudo ficará resolvido e as posições em defesa do Brasil poderão ser diferentes.
Esse gigantesco impasse entre o STF (com notório foco no Ministro Flávio Dino) e parlamentares da Câmara e do Senado se arrasta desde fins de 2023 e se avolumou em 2024, quando a Suprema Corte, ao julgar as ADPFs 850, 851, 854 e 1014, considerou inconstitucional o chamado “orçamento secreto”, pelo qual as mesas das duas Casas se valia para fazer distribuição de emendas de maneira obscura, com indícios graves de cometimento de crime. Na ocasião, o STF estabeleceu a necessidade de transparência e rastreabilidade, medidas que até hoje não foram satisfatoriamente adotadas pelos parlamentares.
O que o STF, com irrepreensível razão, tenta obter, é a adoção de um acordo entre a Corte e o Congresso que evite novos embates e garanta a execução das emendas com critérios de transparência. Nisso se inclui a identificação nominal dos parlamentares ou instituições responsáveis pelas emendas, além de um plano detalhado para a execução dos recursos.
Nesse plano óbvio proposto pelo STF, cabe ao Tribunal de Contas da União (TCU) a tarefa de fiscalizar a distribuição das emendas e julgar as contas sobre sua aplicação.
Simples assim. O que resta saber é quando Câmara e Senado vão entender que isso é o mínimo que a sociedade brasileira exige dos seus representantes, daqueles que ela escolheu para cuidar dos interesses coletivos.
Por José Osmando