Recentemente, em São Paulo, entidades de direitos humanos lançaram a Campanha Estadual Permanente de Prevenção e Combate à Tortura, um movimento social que visa acabar com essa prática em diversos locais, especialmente em presídios, sistema socioeducativo, comunidades terapêuticas e contra a população em situação de rua. A data escolhida para o lançamento da campanha é muito significativa, pois marca os 20 anos do Massacre da Sé, no qual sete pessoas em situação de rua foram brutalmente assassinadas e agentes de segurança foram apontados como suspeitos.
A principal estratégia dessa campanha é a criação de um site exclusivo para receber denúncias, as quais podem ser feitas anonimamente. Além disso, através desse site, é possível marcar um horário com o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo (Condepe), a SOS Racismo e a Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo. Esse recurso também facilitará o encaminhamento de casos para o Programa de Vítimas e Testemunhas (Provita) e para o Centro de Referência e Apoio às Vítimas.
O presidente do Condepe, Adilson Sousa Santiago, destacou que o objetivo é elaborar um relatório inicial com base nas denúncias recebidas no prazo de um mês. Ele ressalta que a tortura evoluiu e agora se manifesta de outras formas, não apenas físicas e visíveis, mas também de maneiras mais complexas e sutis.
Falando especificamente sobre a população em situação de rua, Santiago enfatiza que essas pessoas são frequentemente vítimas de uma “higienização humanitária” realizada pelas forças policiais, especialmente em períodos de grandes eventos. Ele destaca que essa população é uma das mais vulneráveis e violentadas, tendo seus pertences como cobertores e colchonetes tomados, o que contribui para a sua desumanização e exclusão.
Além disso, Santiago menciona que outras localidades do estado de São Paulo, como Campinas, Taubaté e Itatiaia, também têm altos índices de denúncias de tortura, particularmente em presídios. Esse cenário alarmante reflete um problema que atinge não apenas a capital, mas todo o estado paulista, evidenciando a necessidade urgente de medidas eficazes de prevenção e combate à tortura.
Um dado preocupante divulgado pelo Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua da UFMG revela que o Brasil conta com mais de 300 mil pessoas vivendo nessas condições. São Paulo concentra quase metade desse contingente, com mais de 127 mil pessoas, um aumento significativo em relação aos dados de dezembro de 2023.
Roseli Kraemer, membro do Fórum da Cidade de São Paulo e defensora dos direitos das mulheres, relata que, durante a pandemia, passou por dificuldades financeiras e acabou se envolvendo no movimento de defesa da população de rua. Segundo ela, as mulheres nessa situação enfrentam violência física e emocional intensas, decorrentes do machismo estrutural presente nas forças de segurança e na sociedade como um todo.
Edvaldo Gonçalves, coordenador do Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de Rua, lamenta que, mesmo após 20 anos do Massacre da Sé, a investigação não tenha alcançado resultados conclusivos. Ele ressalta a importância de reconhecer o Dia da Luta contra a Tortura não apenas no Brasil, mas em toda a América do Sul, como uma data simbólica de resistência e combate à injustiça.
Em relação às políticas públicas para a população em situação de rua, há uma série de desafios, como a especulação imobiliária, o preconceito e a falta de acesso à moradia digna. André Lucas Zaio, membro do Comitê PopRua, denuncia a discriminação enfrentada por essas pessoas, que são estigmatizadas e impedidas de ter acesso a programas de habitação social. Ele destaca a necessidade de repensar a abordagem acerca da segurança habitacional e criar soluções efetivas para garantir moradia a todos.
Diante desse cenário complexo e desafiador, a Campanha Estadual Permanente de Prevenção e Combate à Tortura se mostra como uma iniciativa fundamental para promover a justiça social, combater a violência e garantir a proteção dos direitos humanos de todos os cidadãos, especialmente daqueles em situações de maior vulnerabilidade e exclusão. É essencial que a sociedade civil, o poder público e as organizações atuem de forma conjunta e coordenada para enfrentar esses graves problemas e construir uma sociedade mais justa e igualitária para todos os seus membros.
Com informações da EBC
Fotos: © Rovena Rosa/Agência Brasil / EBC