Com oportunidades limitadas, baixa valorização e políticas públicas frágeis, o país vê cientistas, engenheiros e profissionais de tecnologia partirem em massa para o exterior
O Brasil está vivendo uma evasão silenciosa e preocupante de seus profissionais mais qualificados. A chamada “fuga de cérebros” já atinge milhares de cientistas, engenheiros e especialistas em tecnologia, que deixam o país em busca de reconhecimento, estabilidade e valorização no exterior. Estima-se que quase 7 mil cientistas abandonaram o país nos últimos anos, segundo o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Essa migração em massa tem se tornado uma ameaça direta à soberania científica e tecnológica nacional, comprometendo a capacidade do Brasil de inovar, desenvolver soluções autônomas e competir globalmente nos setores estratégicos do futuro.
EUA, Canadá, Europa e Oceania lideram o recrutamento de talentos brasileiros
O movimento não é restrito aos Estados Unidos — embora o país lidere em números. Em 2024, os EUA emitiram 2.793 vistos EB-1 e EB-2 para brasileiros, superando a soma dos anos anteriores. Apenas em 2023, quase 30 mil brasileiros receberam o green card, boa parte deles especialistas em áreas como ciência da computação, engenharia de software, cibersegurança e inteligência artificial.
Mas o Brasil também tem exportado cérebros para Canadá, Alemanha, Portugal, Irlanda, Austrália e Nova Zelândia, todos com programas migratórios voltados para atrair profissionais altamente qualificados.
O que atrai os talentos brasileiros para fora?
- Salários em moeda forte (dólar/euro)
- Carreiras estruturadas e estáveis
- Ambiente de pesquisa valorizado
- Incentivo à inovação e produção científica
- Maior segurança institucional e econômica
Falta de carreira científica e tecnológica estruturada no Brasil
Enquanto isso, no Brasil, os obstáculos são evidentes: baixa remuneração, cortes em bolsas, falta de editais, concursos sem foco em pesquisa e condições de trabalho que não condizem com o nível de formação exigido.
Cientistas quase sempre afirmam que foram obrigados a sairem do país porque os concursos no Brasil priorizavam o ensino em vez da pesquisa e mesmo em instituições menores nos Estados Unidos, eles têm acesso a recursos comparáveis aos das melhores universidades brasileiras.
Pós-graduandos: a base da ciência, mas tratados com descaso
Durante 10 anos, as bolsas de mestrado e doutorado permaneceram congeladas, forçando estudantes a sobreviver com valores de R$ 1,5 mil e R$ 2,1 mil. Apenas em 2023 houve reajuste — insuficiente diante da inflação acumulada. Até recentemente, eles não podiam nem trabalhar para complementar a renda sob o risco de perder a bolsa.
Impacto direto na soberania digital e no futuro do país
A migração de profissionais de inteligência artificial, ciência de dados, engenharia e TI compromete a soberania digital brasileira. O país perde sua capacidade de desenvolver soluções próprias e passa a depender cada vez mais de tecnologia importada — um risco geopolítico e estratégico.
A inteligência artificial, por exemplo, já é o motor da nova economia. E enquanto o Brasil forma talentos nessa área, as empresas globais contratam — oferecendo não só melhores salários, mas também reconhecimento e protagonismo em projetos de impacto mundial.
Conclusão: o Brasil forma, o mundo contrata — até quando?
O Brasil precisa decidir se continuará a ser apenas um exportador de cérebros ou se buscará, de fato, ser um protagonista global em ciência e tecnologia. A resposta exige ações concretas e urgentes, como:
- Criação de carreiras públicas para cientistas e pesquisadores
- Investimento sustentável em pesquisa e inovação
- Valorização salarial e institucional
- Reforma na pós-graduação com garantia de direitos
- Fortalecimento de ecossistemas regionais de inovação
A janela de oportunidade ainda está aberta. Mas não permanecerá assim por muito tempo.