O recrudescimento da violência e o fortalecimento de organizações criminosas em vários Estados do país, trouxeram aos governantes outro grave problema atrelado a essa inquietante realidade: o surgimento de numerosas fábricas clandestinas de armas, munições e explosivos espalhadas por todas as regiões, com uma força enorme no municiamento das mais variadas facções do crime organizado.
Esse episódio trágico do Rio de Janeiro, resultante de uma operação das polícias estaduais que deixou 121 pessoas mortas, sob o pretexto de combate ao Comando Vermelho, atiçou a atenção do Palácio do Planalto para o avanço das “armas fantasmas” em poder dos criminosos, embora o fato não seja novo.
Em vários pontos do país a Polícia Federal já vinha monitorando a presença de armas clandestinas, de fabricação ilícita, mas chamou atenção a apreensão feita em São Paulo, no mês de agosto último, de 180 armas, desde fuzis, revólveres, pistolas, carabinas e espingardas, além de bastante munição, todos de fabricação clandestina, na região de Atibaia e Americana. A fábrica era um “negócio de família”, tocado por um homem que mantinha vivas as atividades criadas por seu pai, este se encontrando preso pela mesma prática de crime.
Em outra operação em território paulista, em Santa Bárbara d`Oeste, foi desbaratada uma fábrica que utilizava 11 equipamentos industriais de precisão, como tornos e frisadores. No local, foram apreendidos 150 fuzis prontos, além de mais de 30 mil peças de reposição. A linha de montagem dessa unidade tem capacidade para fabricar até 3.500 fuzis por ano.
O Estado de São Paulo é apontado como o centro mais vital de fabricação de armas clandestinas, com uma história que remonta há mais de 40 anos. O fortalecimento de organizações criminosas fez prevalecer uma dificuldade para os criminosos, relacionada ao abastecimento de armas e munições, a maioria tendo que ser importada, o que dificultava a ação do crime. Daí começam a ser produzidos os primeiros fuzis, armas pesadas que detém a preferência das organizações criminosas.
Nessa sangrenta operação do Rio de Janeiro, na qual foram apreendidas 91 armas de alta precisão, descobriu-se um esquema sofisticado de fábricas clandestinas em Minas Gerais e, novamente, em São Paulo, que abasteciam o Comando Vermelho.
Pela prisão pela Polícia Federal, de Rafael Xavier do Nascimento, em cujo poder foram recuperados 13 fuzis na Via Dutra, tomou-se conhecimento de que pelo menos uma vez por mês era feito transporte de armas e munições clandestinas de São Paulo para o Rio de Janeiro.
Vê-se que, em muitos casos, a fabricação de armas fantasmas é um negócio antigo, muitas vezes familiar, que atua no abastecimento aos integrantes de organizações criminosas. Isso agrava bastante o combate às organizações criminosas, porque as armas clandestinas são bem mais difíceis de rastreamento, dificultando a atuação do aparelho policial e de seus mecanismos de localização.
Essas “armas fantasmas”, são fabricadas a partir de peças ilegais ou impressoras 3D, sem numeração e de difícil rastreamento. Para se ter uma ideia da dimensão desse crime, só em 2025 já foram apreendidas mais de 79 mil armas de fogo.
Em razão dessa realidade, o Governo Federal, através do Ministério da Justiça e Segurança Pública, já andava atento e planejava colocar em ação em 2026 a Rede nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Armas, Munições e Explosivos (RENARME).
O agravamento da situação, contudo, fez o Ministério decidir pela antecipação para agora, provavelmente ainda nesta semana, da atuação desse órgão.
A Rede que o governo quer ver atuando imediatamente foi criado com base na integração do Ministério da Justiça e Segurança com todos os órgãos federais e estaduais no combate ao comércio ilegal de armamentos. E será complementada pela Diretoria de Operações Integradas e de Inteligência (Diopi), Ministério da Defesa e Receita Federal. O objetivo é desarticular rotas de abastecimento e intensificar investigações sobre armas de grosso calibre, com padronização de protocolos e ampliação de intercâmbios de dados entre todos os entes federativos.
Uma das metas do RENARME é apoiar os governos estaduais para que criem delegacias especializadas em armas, munições e explosivos, permitindo fortalecer o combate nas bases em que a clandestinidade está ocorrendo. Atualmente, apenas seis Estados da Federação têm delegacias especializadas em armas. Três estão no Nordeste, Ceará, Paraíba e Bahia, duas no Sudeste, Rio de Janeiro e Espírito Santo e uma no Sul, no Rio Grande, esta gaúcha em operação apenas a partir de 2023.
Por José Osmando













